quarta-feira, 23 de setembro de 2009

ouroboros




sem fim
sem chegar
todos os caminhos me estão postos
e não tenho pés para nenhum

terça-feira, 1 de setembro de 2009

"O que é um santo? Um santo é alguém que conseguiu realizar uma remota possibilidade humana. É impossível dizer qual é essa possibilidade. Eu acho que tem algo a ver com a energia do amor. O contato com essa energia resulta no exercício de um tipo de balanço dentro do caos de nossa existência. Um santo não resolve esse caos; se pudesse o mundo teria mudado há muito tempo.

Não acredito que um santo dissolva o caos nem para si mesmo, pois há algo arrogante e tipicamente guerreiro na concepção de um homem colocando ordem no universo. Sua gloria é um tipo de equilíbrio. Ele desliza à deriva como um ski solto. Seu curso é a carícia do morro. Sua marca é o acúmulo de neve naquele momento específico, arranjado pelo vento e a pedra. Algo no seu interior ama o mundo de tal maneira que ele se entrega para as leis da gravidade e o acaso. Longe de voar com os anjos, ele traça com a fidelidade de uma agulha de um sismógrafo, o estado da sólida paisagem. Seu lar é perigoso e finito, mas ele esta à vontade no mundo. Ele consegue amar as formas das coisas humanas, as formas finas e tortas do coração. É bom ter entre nós tais homens, tais monstros equilibradores do amor.
Leonard Cohen, Beautiful Losers (1966)"


tenho sapatos rotos

Edson Bueno de camargo

riscados de pedra e ladeira abaixo
tenho sapatos de pedra branca
e a terra insalubre de minha infância
o saibro que se desfazia ao vento e a água
e da infâmia acústica de meus ouvidos

tenho os pés lavados de agora
na torneira da chegada
e asas de santo vagabundo de estrada

tenho a beatitude do agora
e o medo obscuro que nunca me chegue a morte

tenho asas dobradas dentro de sapatos rasos
rasgadas à seda de uma lágrima
calçados de caos e areia diluviana

antes a dúvida perturbadora
dos incensos e sírios nas igrejas
da fé não respondida
à certeza que carrego agora